sexta-feira, janeiro 27, 2006

O monstro

Conheço um monstro que passa as tardes sentado num banco de café a ler. Por vezes, quando não está a ler, o monstro deleita-se a observar o fio do horizonte. Sem mais. O fio do horizonte enegrecido por um rasto de fumo de cigarros é o que o monstro vê quando não lê. Pelo monstro passam pessoas e animais, no entanto, para o monstro pessoas e animais são a mesma coisa e, por conseguinte, a diferença entre uns e outros, por vezes, torna-se mínima, quase nula. O monstro é monstro porque vive como se fosse uma formiga a tentar desviar-se do dedo humano que a quer esmagar. O monstro tem medo da vida e, principalmente, do mundo. Se eu não conhecesse o monstro diria que o monstro sou eu. Uma sombra. Uma beata de cigarro.

[Paulo Ferreira]