domingo, setembro 30, 2007
Coração malandro
Há um novo concurso na TVI, apresentado pela já antiga Júlia Pinheiro, que trata do «amor». O dito programa dá pelo nome de Casamento de Sonho, o que, só por si, transmite a ideia de que pelo menos duas pessoas tentarão atingir a perfeição sentimental. Sabe-se que não haverão facilidade mas, nestas coisas, não existem facilidades. O amor é exigente. As relações são quase sempre traumáticas. Por esse motivo, aparecem as «belas» e os «belos», que tentarão desviar os pombinhos através da «quebra de confiança» e do ciúme. O óbvio diz-nos que, no final, a certeza se elevará em relação à dúvida e a perfeição vencerá a desconfiança. Haverá o beijo apertado, as lágrimas do mastronço e, claro, o pedido de casamento. No entanto, o problema das relações afectivas não está no «Outro» mas sim em nós próprios. Não é a televisão que nos condena ou julga. Somos nós. O pior para aqueles pombinhos que se querem casar está cá fora, no dia-a-dia, na realidade crua e dura.
[Paulo Ferreira]
Concepção antropológica
O ser humano é intrinsecamente bom? Não, não é. Ele gostaria de ser, mas não é. E quando ele faz questão de ser bom, já aí reside uma certa maldade. Porque para se ser parece que é preciso ser melhor do que os outros. E também aí reside já uma certa vaidade, excessiva, um defeito desse ser humano complicado.
[Paulo Ferreira]
Relações
- Nunca melhoram. É como numa peça de teatro. Essas também não melhoram. Se quiseres sair no intervalo de uma peça, sai, porque não vai melhorar.
Philip Roth, Traições (edição portuguesa de Deception)
[João Carlos Silva]
Stringer Bell
sábado, setembro 29, 2007
O ponto (Robert Walser)
Solidão
[Paulo Ferreira]
Noites
The end of the world as we know it
[João Carlos Silva]
O santo milagreiro
José Pacheco Pereira, Abrupto
[João Carlos Silva]
sexta-feira, setembro 28, 2007
Uma casa em S. Bento
[Paulo Ferreira]
quinta-feira, setembro 27, 2007
Miguel Tiago Crispim Rosado - JCP
[Paulo Ferreira]
O estado das coisas
Um novo estrebuchar
[Paulo Ferreira]
Santana Lopes abandona a entrevista
[João Carlos Silva]
Direitos sob ataque
Os direitos andam a ser retirados a toda a gente, e agora chegou a vez em que esses direitos são retirados às pessoas portadoras de deficiência – na mesma altura em que o governo divulga exactamente o contrário. Não há limites para o poder da televisão e dos meios de comunicação. Isso toda a gente sabe. O que não nos lembramos é que esses meios, quando utilizados por um governo, também eliminam os limites do poder pessoal do Primeiro-Ministro.
[João Carlos Silva]
Caminho
[Paulo Ferreira]
Sonho e realidade
[Paulo Ferreira]
Quebrar
[Paulo Ferreira]
Guardar II
[Paulo Ferreira]
Guardar I
[Paulo Ferreira]
terça-feira, setembro 25, 2007
A ausência do debate
O debate mensal no Parlamento foi, para mim, bastante elucidativo do estado em que está a política nacional. Sentado num trono «dourado», José Sócrates respondia às questões (legítimas) levantadas pela oposição com um ataque baixo e pessoal ao carácter desses deputados. É fácil ver como a comunicação pessoal, e a opinião pública em geral, sofre a manipualação do governo: Sócrates respondia às questões insultando o seu interlocutor e rematando «não vale a pena atacar-me pessoalmente», quando é o próprio Primeiro-Ministro quem tem esse estilo. Projectando nos outros o que ele próprio faz, passa para uma opinião pública desinformada a ideia, e o «soundbyte», dos «ataques pessoais da oposição».
A determinado ponto, Heloísa Apolónia (figura que nem me agrada particularmente) refere uma questão específica e simples: a do amianto utilizado na construção de escolas - por contraponto às maravilhas tecnológicas que o PM garante estarem a brotar do chão escolar em pleno recreio - que seriam nefastas para a saúde dos petizes. Relevante ou não, a questão era simpoes. Mas Sócrates resolveu responder com um insulto à relevância política da senhora e à «questão Verde Eufémia», que não sei como se poderia relacionar com aquele caso.
Já Francisco Loução e Jerónimo de Sousa (figuras que também não me agradas, respectivamente, a nível pessoal e a nível ideológico) levantaram questões essenciais das relações próximas entre Estado e privado (concordo que estes não devem estar promiscuamente envolvidos em quase nada, apesar de esta não ser a visão do sr. Louçã) e depararam com ataques à validade dos seus partidos e ao carácter de Louçã. Independentemente do que possam merecer, nem Apolónia, nem Louçã, nem Jerónimo viram as suas perguntas respondidas.
Com Marques Mendes e Paulo Portas, adversários naturais, o mesmo se passou, não sendo isso novidade, mas com a particularidade de terem dado um belo «contra» ao histerismo de José Sócrates. Gostei da intervenção de ambos, especialmente da de Mendes (com mais conteúdo e mais argumentado).
Por isto tudo, da próxima que ouvirem alguém referir que os políticos da oposição fazem «ataques pessoais» ao Primeiro-Ministro, mostrem-lhes a última sessão de debate mensal no Parlamento. Só acredito nisto: num Parlamento britânico, Sócrates teria sido trucidado politicamente, sem hipótese de escapar às questões. E será que iriam dizer que os deputados tinham sido malcriados? Acho que não.
P.S.- a propósito de aliados do Governo no Parlamento, Alberto Martins tem um rival na sua disputa pelo amor do Primeiro-Ministro. A relativa brandura de Sócrates para com o Bloco de Esquerda deixa entrever uma coisa: o PS não está a fechar aquela porta para 2009, ou seja, o Bloco está na lista de amigos de Hi5 do PM. A rever dentro de meses.
[João Carlos Silva]
Patrulhas ideológicas
Eu sabia que a esquerda portuguesa e europeia andava louca por Hugo Chávez, mais do que a rapaziada – nova e velha, advirta-se – andava louca por Scarlett Johansson. Chávez, um Fidel em versão “estrela de televisão”, pôs as cabeças de muitos políticos e intelectuais portugueses à roda – não se verificando, no entanto, por parte de nenhuma destas corajosas almas, um vestígio de desejo de ir morar para a Venezuela, país tão livre e democrático que faz os “Founding Fathers” norte-americanos corar de inveja. Só vejo o ditador venezuelano mais na moda, e mais no coração da esquerda portuguesa, se ele recebesse um Nobel. Galardão político esse para o qual já faltou menos: só lhe falta escrever um livro.
[João Carlos Silva]
segunda-feira, setembro 24, 2007
Expectativa e frustração
[Paulo Ferreira]
Luta
[Paulo Ferreira]
Livros
[Paulo Ferreira]
sábado, setembro 22, 2007
Derrota
[Paulo Ferreira]
sexta-feira, setembro 21, 2007
Amigos
[Paulo Ferreira]
Potência
Da diferença entre o nosso tamanho e força
Do poder das suas pernas
Da rapidez das minhas
Quase o matou mas acabou por vencer
E depois ouvi-o vomitar atrás da cabana
Nessa noite fui para a cama
E sonhei com a potência de um comboio
- Sam Shepard, Lua Falcão
[Paulo Ferreira]
Oops (ou «quando não se deve corrigir uma frase»)
- Jerónimo de Sousa, no debate mensal no Parlamento, 21/09/2007
[João Carlos Silva]
quinta-feira, setembro 20, 2007
O visconde de Calvino
Italo Calvino (1923-1985) é um dos maiores escritores do século XX. É algo pomposo e taxativo de se dizer mas, de facto, Calvino é uma figura central da literatura do século passado. Para além disso, é um dos meus escritores preferidos: pelos temas, pela escrita, pela aparente inocência da sua linguagem. Acabo de ler há dias O Visconde Cortado ao Meio com a sensação de enorme conforto que nos fica de belas refeições e dos mais belos momentos físicos das nossas vidas. O ritmo da escrita de Calvino é quase musical, uma sinfonia que passa pelos nossos olhos quase sem esforço, já que, como uma vez disse um granda livreiro português, «ler é uma chatice, mas é a única forma de chegar ao conteúdo dos livros, à vida dos livros». Ora, ler Calvino é a antítese desta sentença.
O visconde Medardo de Terralba (protagonista da obra) havia ficado mutilado na guerra com os Turcos. Cortado em dois por uma malograda bala de canhão, Medardo volta à sua terra natal, Terralba, apenas com uma dos lados do corpo, «decepado» na vertical. Aparentemente, voltara apenas a sua «metade má», passando o visconde a atormentar os seus próprios súbditos, desde enforcamentos em massa a pequenas patifarias com um toque de crueldade infantil - como abrir buracos nas pontes para os camponeses lá caírem.
Pelo meio várias personagens se juntam à narrativa: Pamela, a sua amada; o doutor Trelawney, que, apesar de ter viajado com o capitão Cook, «pouco ou nada tinha visto durante as suas viagens, porque passava o tempo todo no porão, a jogar ao sete-e-meio com os marinheiros»; o artesão Pedro Prego, que construía, para seu desprazer, máquinas de execução e tortura para o visconde, embora a estética das construções o maravilhasse; e o narrador, uma criança que é sobrinho do próprio visconde.
Aliás, a «inocência» da escrita é de certa forma parente do facto de o narrador ser, habitualmente, uma criança: seja sobrinho do protagonista nesta obra ou, por exemplo, o irmão do barão protagonista d' O Barão Trepador.
Para finalizar, resta dizer que a chave do livro está no surgimento de uma nova personalidade misteriosa do visconde de Terralba que, aparentemente, faz o bem de forma tão veemente como faz o mal. Esta duplicidade divide os habitantes a partir do momento em que o «benfeitor», ao denunciar os pequenos crimes inocentes, se torna tão insuportável quanto o terrível tirano que é o visconde mutilado regressado da guerra. Ou seja, e como diz o narrador, os habitantes sentiam-se «perdidos entre a malvadez e a virtude igualmente desumanas». É precisamente nesta duplicidade, nesta ambivalência, que reside a chave do livro, que reside a essência das duas naturezas do visconde. Das duas naturezas, enfim, do próprio homem. Poucos escritores transformariam esta questão num livro tão memorável. Italo Calvino é um deles. O desfecho deixo ao leitor essa oportunidade de descoberta.
[João Carlos Silva]
Devil's Playground
O debate de ontem na SIC Notícias entre Marques Mendes e Luís Filipe Menezes foi um bom exemplo de como o PSD perdeu a excelente oportunidade para ressuscitar o partido que estas eleições directas constituíam. (...) Pois se a ausência de pessoas como Rui Rio significaram a ausência de um eventual projecto alternativo ao de Marques Mendes, a de Menezes apenas serviu para puxar Mendes para a lama onde o autarca de Gaia habitualmente chafurda.
Tirou-me as palavras da boca.
[João Carlos Silva]
quarta-feira, setembro 19, 2007
Adaptação
[João Carlos Silva]
terça-feira, setembro 18, 2007
O falhanço da imaginação
Mil Novecentos e Oitenta e Quatro é um daqueles livros que, mais tarde ou mais cedo, acabam por ser lidos. Há sempre um amigo ou conhecido que diz que a coisa vale a pena. Há sempre um professor ou alguém em quem se deposita confiança que recomenda a obra. É normal. É assim que uma obra se torna clássica. De boca em boca ao longo dos anos.
Um clássico tem a particularidade de ficar marcado por uma ideia ou por um tema simplificador. Em Crime e Castigo, por exemplo, é evidente a necessidade de Raskolnikov atravessar o seu abismo até chegar à redenção. No pesado Em Busca do Tempo Perdido, há um rapaz que atravessa o seu passado à procura de algo que nunca voltará atrás – o tempo. Na Odisseia, de Homero, temos, uma vez mais, uma continuação do título no fio narrativo que acompanha as deambulações de Ulisses, temos uma sucessão de viagens extraordinárias. Ora, na obra de Orwell em análise, não há a clarividência das obras atrás mencionadas, no entanto, sabe-se que 1984 é uma data do futuro. George Orwell, em finais da década de quarenta do século passado, imagina um futuro na qual o mundo é governado por um regime tirânico e completamente dominador, que usa o poder como um fim e não como um meio. O «Grande Irmão» está sempre presente, as pessoas estão sempre a ser filmadas. Há uma «Polícia do Pensamento». Usam-se constantemente as seguintes palavras de ordem: «Guerra é paz», «Liberdade é escravidão»; «Ignorância é força». Há sempre uma grande deturpação da verdade antiga, da verdade que usavam os povos que não viviam para o progresso avassalador. A verdade nova é aquela que interessa. Mesmo o sexo faz mal aos povos. Sob o regime do Grande Irmão, o sexo é proibido. Há quem pense acabar com o orgasmo. Não será difícil imaginar uma sociedade assim num futuro hipotético, tal como fez Orwell.
A tirania retratada por George Orwell não é uma qualquer. Claro que existem pontos de encontro entre todos os regimes que usam a não-liberdade como porta-estandarte. Claro que se poderá pensar numa qualquer ditadura de um passado recente e associá-la a este livro. Acontece que Mil Novecentos e Oitenta e Quatro se associa, muito especialmente, à União Soviética. É o sorriso que se esconde por detrás do bigode do grande chefe que se pretende descodificar. Orwell, tendo participado na Guerra Civil Espanhola, não ficou contente com aquilo que viu por parte de gente que deveria estar do mesmo lado da barricada. Os estalinistas, em vez de se juntarem a anarco-sindicalistas e a trotskistas, põem-se contra eles e combatem-nos. Orwell revolta-se contra isso, mesmo sabendo que nenhuma variante do comunismo «oficial», como o anarquismo, poderia alguma vez ser aceite pelos camaradas de Moscovo. Para Estaline e para os seus, era mais importante atacar o anarquismo em Espanha do que impedir Franco de obter o poder absoluto. Assim sendo, poder-se-ia argumentar que Mil Novecentos e Oitenta e Quatro, apesar de ter o seu desenrolar num futuro algo distante daquele que escreve o seu autor, é também um livro que tenta criticar a brutalidade soviética em Espanha. Notam-se as sucessivas tentativas do autor de colocar as suas personagens em situações nas quais a manipulação da história e a mentira são um modus operandi. Na Terceira Parte do livro, a tortura, a primazia da cultura do ódio, a ideia de poder ilimitado, a violência, a despersonalização das massas e a perda de individualidade do ser humano estão mais do que presentes.
Vítima de tudo é Winston Smith, um homem que, enganado por O’Brien, um indivíduo da estrutura governamental, adere àquilo que pensa ser a «Fraternidade», uma organização clandestina e revolucionária inspirada nas ideias de Goldstein, isto é, Trotsky, o traído, tanto na URSS como em Espanha. É na «Sala 101» que Winston encontrará o pior dos seus medos, as ratazanas. É nessa sala que os homens do Grande Irmão põem à prova a resistência física e mental dos traidores do partido. Em termos de uso de violência, é nesta Terceira Parte do livro que Orwell atinge o seu pico. Na Primeira Parte, há a «descoberta» de Winston e da sua cidade, Londres, anti-capitalista, dominada pelo regime já descrito. A Segunda Parte é, quanto a mim, o sumo do livro. É a parte mais romanceada. Winston conhece Julia e por ela se apaixona. Muitas páginas se passam nesse clima de devassa. Todavia, finda a segunda parte, deixa de haver espaço para os dois namorados. Volta a ser o Grande Irmão o grande protagonista.
Julia e Winston Smith precisavam de mais espaço e de mais vida um ao lado do outro. É essa a parte que mais interessa de toda a obra. No entanto, Orwell não quis seguir o caminho do «romance» e decidiu explorar uma ideia política. Quanto a mim, fez mal. Torna-se banal. Boris Pasternak, no seu magistral Doutor Jivago, soube explorar bem essa história de amor em tempos de ódio. Orwell não soube, ou não quis saber. E, por isso, limita-se à construção de uma realidade ficcional que já existia na realidade da vida.
[Paulo Ferreira]
O lobo camuflado de cordeiro
Até aqui tudo muito bem, tudo pintadinho dentro das linhas, sem borrar a imagem. Toda a gente gosta de ver isto: o pai (Estado) dando a mão às crianças (nós), para que um dia mais tarde as crianças agradeçam. O problema é que isto não passa de uma manobra de diversão. No Correio da Manhã de 16 de Setembro surge uma notícia num sentido bem diferente. A partir de agora, para se ter direito às «facilidades de acesso» (assim entre aspas, porque a «facilidade» não é mais que uma atenuante) e de locomoção, já não basta ter 60% de incapacidade. Assim mesmo, em percentagem, que é a desgraça é percentual e objectiva.
Ou seja, para uma pessoa com deficiência poder ter acesso a isenções fiscais (logicamente que os automóveis, por exemplo, ou outros bens devem estar isentos de cargas fiscais como o Imposto Automóvel, já que, se um carro não é um luxo, muito menos o é para quem precisa dele para chegar são e salvo ao emprego, por impossibilidades físicas), deve-se sujeitar à avaliação de uma junta médica - mas que raio é uma «junta médica»? - que deverá, por sua vez, declarar como «elevada» a dificuldade que tal pessoa tem em mexer-se. Se uma pessoa não tiver uma das pernas, é bem possível que seja declarado que 50% das pernas ainda mexem bem, logo pode muito bem apanhar o autocarro para o emprego. Se quer carro, pague o mesmo que os outros.
Se quer continuar a apoiar este governo de mentirosos, tem todo o meu respeito. A liberdade de escolha é bonita eu gosto. Se não se importa de que um governo lhe roube (e ao seu vizinho) direitos e que, com o dinheiro que também lhe rouba, faça falsa propaganda para limpar a sua imagem, então muito bem. Mas devo avisar-lhe que não precisa de fazer muito parceber que há algo mal neste quadro: basta reparar nas pequenas incongruências (que a propaganda não deixa ver à «primeira vista» mas que a realidade deixa por vezes a nu) e dizer que «Não» a José sócrates. É muito fácil deixar de ser enganado.
[João Carlos Silva]
Vendo a RTP
[João Carlos Silva]
O caminho
Para ser uma verdadeira alternativa ao PS, e assim regressar ao poder e exercê-lo em vez de ser seu refém, o PSD precisa de, adoptando um programa «liberalizante», criar uma «coligação de vontades» que, indo da «direita» ao «centro-esquerda» (como o fizeram Sá Carneiro e Cavaco), concentre a sua campanha nesse «centro-esquerda». E que o faça, não cedendo ao estatismo que esses eleitores tradicionalmente preferem, mas procurando mostrar-lhes como o liberalismo, mais do que o Estado Social a que se afeiçoaram, promove melhor a tal «justiça social» que desejam, promove melhor uma sociedade na qual não apenas eles, mas também o seu vizinho, poderão ter uma vida melhor.
Bruno Alves, Atlântico Setembro 2007
[João Carlos Silva]
Autoclismo
Para quem tenha vivido em Londres, é [...] difícil conceber algo mais perigoso vindo de um Mayor do que, em nome da protecção do ambiente, apelar a que os londrinos poupem água na sua higiene pessoal, como [Ken] Livingstone fez em 2005, quando pediu aos habitantes da cidade para não puxarem o autoclismo quando tivessem apenas urinado. Como já foi sugerido, um voto em Boris [Johnson] é um voto a favor de puxar o autoclismo sempre que se queira.
André Azevedo Alves, Atlântico Setembro 2007
[João Carlos Silva]
A voz
Quería escribir una carta, pero como el tiempo ya no estaba para eso, tomó el teléfono y marcó un número.
Se olvidó, quizá, que era un sujeto muy tímido. Nunca conseguiría decir aquello que debería ser escrito y remitido por correo.
—Hola— se oyó. No consiguió decir nada. Apenas un largo silencio salió de su boca.
Añoraba más, al mismo tiempo, se sentía vencido por el tiempo y la distancia. —Hola— No habló. Y la idea de una carta no avanzó. Y el corazón latió cada vez más, hasta parar.
E o original:
Queria escrever uma carta mas, como o tempo já não estava para isso, pegou no telefone e marcou um número. Lembrou-se, porém, de que era um sujeito muito tímido. Nunca conseguiria dizer aquilo que deveria ser escrito e remetido por correio. «Estou?», ouviu-se. Nada conseguiu dizer. Apenas um longo silêncio saiu da sua boca. Estava com saudades mas, ao mesmo tempo, sentia-se vencido pelo tempo e pela distância. «Estou?» Não falou. E a ideia de uma carta não foi para a frente. E o coração bateu sempre cada vez mais, até parar.
[Paulo Ferreira]
domingo, setembro 16, 2007
Luís Freitas Lobo
[João Carlos Silva]
Scolari naturaliza-se português
Eu já há muito tempo que vinha a gostar menos de Scolari. Aliás, nunca o achei um treinador particularmente empenhado nos treinos e no domínio táctico e técnico (isso, aliás, vê-se no campo), mas gostava da inteligência com que ele manipulava emocionalmente os jogadores, os adversários e o público para certos jogos. O jogo psicológico é uma parte importante do futebol. Ainda assim, nunca alinhei na corrente «anti-Scolari». O homem foi um trunfo importante na mudança de mentalidade da equipa. De outsiders patéticos (o Euro 2000 pode ser visto como um acidente de percurso com o sebastiânico Humberto Coelho) passámos a equipa temida por qualquer outra selecção. Isso ninguém lhe tira.
O seu tempo acabara há muito, na minha opinião. No entanto, e ao contrário da tese geral de que «se deve aproveitar este momento (o do soco) para expulsar Scolari», acho que a chapadinha amorosa a Dragutinovic veio complicar as contas. É que eu lembro-me de pouca coisa boa na selecção, lembro-me de muitos fracassos, mas nada me entra tão bem na memória como os momentos que importalizaram tantos jogadores portugueses. As cabeçadas de Paulinho Santos ao João Pinto, o murro do próprio João Pinto ao árbitro (Mundial 2002) e o saudoso soco do Sá Pinto ao Artur Jorge faz agora 10 anos. Nada nos faz mais portugueses do que esmurrar quem não gostamos. É viril, é de homem e é sincero. Faz bem à saúde e dizem que evita o cancro. Para quem tinha dúvidas se devíamos ter um brasileiro a treinar a selecção, pode estar descansado. Depois deste dia, Scolari é português.
[João Carlos Silva]
sábado, setembro 15, 2007
Livros, livros
Só uma nota, Luís: excelente referência à banda-desenhada. É que, no meu caso, foi com ela que eu aprendi muitas coisas e a primeira delas foi aprender a estar sossegado e simplesmente ler e imaginar. Antes das letras, as imagens (da BD) conquistaram-me.
[João Carlos Silva]
Época quente
O dia quinze de Setembro não tem o encanto que teve o dia quinze de Agosto ou o dia quinze de Julho. O tempo, apesar de continuar abafado e digno de um país norte-africano, não é igual a outros tempos. Nota-se que um céu menos azulado invade as vidas de quem trabalha e de quem não trabalha. Daqui a pouco, estamos no Outono, na época da queda das folhas, do início do frio. Ora, nada tenho contra o tempo menos quente. Prefiro andar com camisa todos os dias do que andar nu para não transpirar. O Inverno é a minha estação. Gosto de chuva, de cobertores e de chocolate quente com jornais. Mas também gosto de algo que só se vê no Verão: pernas de mulheres.
Mulheres com saias, sem saias, com sapatos, sem sapatos, mas sempre com pernas ao léu. O único incentivos que o divino me concede nestes dias de extremo calor é o de poder sair de casa para ver pernas castanhas e suadas. Vinicius de Moraes dedica um poema à mulher que passa (Como te adoro, mulher que passas/Que vens e passas, que me sacias/Dentro das noites, dentro dos dias!). Eu sou mais específico: dedico uma vida às pernas que passam. É uma obsessão clara. E um atrevimento. E uma invasão de propriedade. Não tenho qualquer tipo de autorização para espiar as pernas da senhora que passa, nem sequer tenho Green Card para poder adivinhar o desenrolar daquilo que será nádega e parte íntima. Não tenho nada. Sou um tímido atrevido. Mas só no Verão. Só no Verão é que tento adivinhar as surpresas sexuais de cada mulher.
Admito: há duas semanas, lembrei-me do felatium que Chloe Sevigny fez a Vincent Gallo no aborrecido The Brown Bunny. Pensei: o Verão é isto. Sexo. Para minha grande infelicidade, essa época está quase no fim.
[Paulo Ferreira]
sexta-feira, setembro 14, 2007
Estado das coisas: Hobsbawm
Tendo acabado de ler Revolutionaries, de Eric Hobsbawm, posso afirmar que não tenciono voltar a pegar tão cedo neste livro. Tal como em Indústria e Império, a sensação de enfado é constante. Lembro-me de adormecer na página noventa e nove e acordar duas ou três páginas depois. Hobsbawm não é um historiador com o charme da piada. Não faz rir, não faz o leitor reflectir, não coloca grandes questões. Niall Ferguson, por seu lado, usa e abusa do humor. Conta piadas como quem coloca perfume para ir ter com mulheres. É de outra geração e de outra facção. Hobsbawm tem um passado de marxista e é nessa condição que nos são apresentados os ensaios de Revolutionaries. São ensaios comprometidos politicamente com uma causa que acabou. Quando escreve sobre o anarco-sindicalismo, Hobsbawm não esconde o seu pendor marxista. O seu nojo pelos desviantes anarquistas que colaboraram na Guerra Civil Espanhola é quase tão grande quanto o fervor que alguns tiveram durante os combates da II Internacional. Até Bernstein, um revisionista, leva com a farpa do historiador. Não se pense, todavia, que o autor não tem os seus méritos, porque os tem. Basta consultar a sua bibliografia para se perceber que, provavelmente, mais ninguém escreveu tanto sobre a época contemporânea do que Hobsbawm.
[Paulo Ferreira]
Intelectual
- Eric Hobsbawm, Revolutionaries
[Paulo Ferreira]
quinta-feira, setembro 13, 2007
Veredas
A bala. Podes não ter confiança no teu próprio corpo. Podes precisar de andar às cambalhotas e aos tropeções. Mas nunca desconfies da direcção que uma bala leva: se ela for apontada ao teu coração, é o teu coração que sairá perfurado.
A linha recta é inimiga da espécie: se quiseres sobreviver ao gatilho, procura o movimento que se encontra nas curvas.
[Paulo Ferreira]
quarta-feira, setembro 12, 2007
Livros - amor não correspondido
[João Carlos Silva]
terça-feira, setembro 11, 2007
10 livros que não mudaram a minha vida
A convite do Luís Ene, também vou meter o bedelho na corrente dos «10 livros que mudaram a minha vida», que o manuel a. domingos trouxe à vida.
No que toca aos livros, confesso o meu pecado: sou um relativista. Se, por um lado, sou perigosamente e orgulhosamente reaccionário nas escolhas literárias - recusando tudo o que está na moda ler e perdendo, obviamente, de vez em quando, a oportunidade de ler um bom livro -, por outro, gosto também de consumir muito lastro literário. Atenção, disse «lastro», não «lixo». Ou seja, livros importantes que ajudam a equilibrar os meus grandes autores «eleitos», mas que no fundo não «chegam a mim», de facto.
Mas é verdade que a procura incessante de saciar a curiosidade em relação a vários autores por vezes redunda num conhecimento superficial da herança literária universal. E por universal digo aquilo que todos nós podemos ler, quando quisermos, se quisermos, apenas em troco de algumas notas (ou de algumas moedas, em casos fortuitos). Conhecer o cânone através de flashes descontraídos deste ou daquele escritor acaba por ser uma viagem interessante, mas uma viagem de turista. Ora aí está, sou um turista literário. Um «leitor-turista», que lê de tudo um pouco, e gosta sempre pelo menos um pouco de tudo o que lê. Guloso mas pouco académico. Para além disso sou escandalosamente relativista. Tudo tem o seu valor.
Ser relativista acaba por ser um pouco a atitude verdadeira de respeitar o livro. Respeitar o trabalho do autor e o próprio escritor. Muitas vezes os livros que não mudam a nossa vida, ou seja, os livros que começamos a ler entusiasmados e acabamos desiludidos são apenas um dos lados de um polígono literário com várias obras-primas. De outras vezes, é o próprio estilo do escritor que nos aborrece. Veja-se o Adeus às Armas de Hemingway, livro monótono de um escritor que inculcou o incontornável O Velho e o Mar no meu universo mental mas que me provou que a fama muitas vezes não é tudo. É preciso gostar de Hemingway para ler Hemingway, caso contrário é a desilusão. O encontro com a inércia da acção. O remédio (antídoto de prevenção) é começar pelo último que referi, um excelente livro.
Mais dois livros que não mudaram a minha vida foram, provavelmente, O Admirável Mundo Novo de Huxley ou o Trópico de Câncer de Henry Miller. Do primeiro nada a dizer senão «era isto?». Do segundo, ressalta uma palavra: deboche. Pouco mais. Em alturas de solidão, o deboche é alimento, mas não muda a vida de ninguém. Talvez se explique assim a passagem pelos 120 Dias de Sodoma, que me pôs quase doente por alguns dias e com vontade de me mandar a mim e ao Marquês de Sade para o psicanalista do Woody Allen. Pena que ele não seja deste tempo. O marquês, digo.
Entre os autores portugueses, uma má experiência, uma expedição irracional e uma aventura didáctica. Respectivamente: A Sibila, um livro de Agustina Bessa-Luís que me vacinou, talvez, para o resto da minha vida (para rematar, enquanto lia no parque tive a revelação crítica de um pombo que deixou cair, directo do seu traseiro, uma opinião numa página do livro); cerca de doze livros de Pedro Paixão (os da Cotovia), que me fizeram viciar não sei bem porquê e só com remédios pude acordar do transe e perceber que não era assim tão viciante; e os contos de Manuel Tiago, preparação para me aventurar no Até Amanhã, Camaradas, aventura esta que, felizmente, ainda não foi levada a cabo.
Entre livros mais políticos, lembro-me de dois, assim do nada, que realmente deixaram pouco. A Funda, do Artur Portela Filho (que continuo, no entanto, a ler) pede uma base de conhecimento detalhado da cultura e da política do início dos anos 70 que, realmente, não tenho. É crítica política efémera, no sentido em que se perde no tempo. Por isso não fica, tal como o porta-estandarte de Irving Kristol, em Neoconservadorismo: autobiografia de uma ideia. Em tempos universitários, a deriva cultural e intelectual levou-me, por vezes, à loucura. E à procura de identidade. Julgava que Kristol ia mudar a minha vida. Não mudou. Felizmente.
Por fim - um caso que já aconteceu, nem que seja uma vez a toda a gente -, um livro que li mas não ficou. Entrou por um olho e saiu por outro. Ou seja, um livro que eu queria que tivesse mudado a minha vida e não mudou, apesar de ter todo o conteúdo para tal. O Heart of Darkness, de Joseph Conrad, foi por mim lido numa altura em que o sono surgia pouco nas minhas noites. Tempos áridos de ideias, ávidos de leitura mas escassos de energia. Lembro-me de ter começado a lê-lo, acabá-lo e cair a dormir. No dia seguinte, não me lembrava de uma única frase. Nem uma linha sublinhada.
Felizmente, há livros que não mudam a nossa vida. Mas que ficam tão gravados na nossa memória quanto aqueles que realmente gostámos, às vezes até mais. Episódios de leitura caricatos, tentativas de «comer» centenas de páginas em poucas horas e livros tão maus que trazem o sono de volta até ao leitor mais insone. Todos eles ficam na nossa memória, nem que sejam pelas piores razões. Mas não se espere que sejam outros livros a mudar a nossa vida. Aliás, não se espere nada dos livros. Os livros são um mundo melhor do que aquele que pisamos, são um mundo mais perfeito e mais emotivo, mas numa coisa não variam do mundo verdadeiro: pouca coisa boa nos trazem. Mas o pouco que têm vale a pena. Por vezes, dou por mim a pensar: qual é o meu mundo?
*Interessante agora seria saber o que poderia ter uma lista elaborada pelo próprio Luís, pelo Bruno (que tentará repudiar o convite, o que o faz muito mais aliciante), pelo Tiago, ou pelos meus conterrâneos Luís Silva e Luís Marvão.
[João Carlos Silva]
As odes de Ricardo Carvalho
Uma boa equipa de futebol, tem, pelo menos, um central genial a jogar sempre os noventa minutos. Infelizmente, no último Sábado, não vi nenhum central decente a jogar contra a Polónia. Fernando Meira é um bom jogador mas não consegue mandar na defesa. Não vacila, mas é limitado. Sobre a titularidade de Bruno Alves, nada digo. Por outro lado, fez-me uma certa pena ver Jorge Andrade no banco de suplentes a bater palmas e a incentivar os seus colegas. Mesmo em péssima forma, este mulato será sempre melhor do que Meira ou Alves. Isso deve-se a um factor de vital importância: o saber jogar. Jorge Andrade, sendo central, sabe como colocar a pantufa na bola. Mas também não é aquele craque maravilhoso.
O melhor central português no activo é Ricardo Carvalho. Arrisco mesmo afirmar que Ricardo Carvalho é dos melhores centrais que Portugal alguma vez teve. Aqueles cortes providenciais são qualquer coisa de outro mundo. O avançado adversário vai a rematar para a baliza, quase a festejar golo, e, sem que nada o fizesse prever, chega Carvalho por detrás ou pelos lados e corta o esférico. Para além disso, nota-se uma diferença abismal entre o jogador do Chelsea e os seus companheiros de posição. Carvalho, ao contrário de todos os outros, sabe receber uma bola no peito e começar a correr até ao meio-campo adversário com fintas à mistura. Incomparável. Dizia-se há uns anos que Fernando Couto e Jorge Costa formavam a melhor dupla de centrais do mundo. Pelo que vejo, o futebol de Carvalho é de outra dimensão. É um futebol mais pensado e, por conseguinte, menos português. Bruno Alves, apesar de novo, sabe o que representa a posição de central na selecção: jogar com o corpo, empregar cacetada, fazer falta, levar cartões vermelhos. Pepe é, de igual modo, um central que tem uma forma de jogar muito portuguesa. Já foi expulso num jogo do seu clube, o Real de Madrid. Há ainda outros centrais mais fracos e mais violentos, como Ricardo Rocha. Mas não há mais nenhum ao estilo de Ricardo Carvalho. Este é um dos professores do futebol. Calado, tímido, simples, humilde, prefere discursar com a bola parada no peito ou a cabecear para os pés de um seu companheiro. Aposto que, se este homem não estivesse lesionado , no último jogo, o nervosinho do guarda-redes teria sido menor e teríamos ganho aos polacos. Mas não. Jogámos à Scolari, isto é, de forma grosseira e analfabeta.
[Paulo Ferreira]
segunda-feira, setembro 10, 2007
O ex-marxismo de um livro
O neo-realismo viveu dentro dessa esfera comunista. A vontade de salvar o planeta era realmente forte. Tanto que a literatura desses autores chamados neo-realistas era, na sua grande maioria, escassa em termos de qualidade. A Fernando Namora, por exemplo, apenas faltou dizer que na América se comiam criancinhas ao lanche. Outros autores seguiram este caminho «vermelho» e, como resultado de um enorme empenhamento sentimental, escreveram livros com martelos nas mãos, em vez de usarem esbeltas e inteligentes canetas. Infelizmente, o neo-realismo passou-se desse modo. Não admira, por isso, que um autor de excepção como Vergílio Ferreira, não se tenha sentido muito preso a essa corrente. Mudança (1949) marca o final de um ciclo e o começo de outro. Apelo da Noite (1963), livro que aqui pretendo abordar, mesmo que de forma breve, é um dos tijolos que o autor usou para construir a sua fama de existencialista. Adriano, personagem principal, vive cabisbaixo com os livros que escreveu, com as criticas que recebe, com a vida que não compreende. Sabe que há uma solidão que o inunda mas que não consegue explicar. Ao lado desta figura, estão os amigos. Os que criticam Malraux ao afirmarem que quem reflecte não ergue um dedo. Malraux, para os amigos, é fascista, não defende a «causa». A revolução, para esta gente, é o fim a atingir. Adriano, por seu lado, apesar de acompanhar os seus companheiros nas suas diatribes, não deixa de estar desencantado. Sabe que o mundo não deve ser salvo pelos homens. Provavelmente, Adriano, como todos os outros Adrianos de Vergílio Ferreira, encaixam na mentalidade do criador. Ou seja, encaixam no desencanto de um homem que conhece o medo do indivíduo de ficar a sós consigo, que sabe que o homem está reduzido a si próprio.
«Ultimamente sós em nós.» Esta é uma das melhores frases de Adriano. Os amigos limitam-se sempre a pensar coisas como esta: «O sacrifício do operário será a vitória total de amanhã.» Vergílio Ferreira, quando escreveu Apelo da Noite já não tinha o fervor de antigamente. Nota-se um certo escárnio nas aproximações do «herói» da narrativa à ideia de revolução, há um gozo notório em tudo o que diz respeito às ideias dos senhores da bolchevização. Mesmo assim, refira-se que o final da história é simbólico: perdido em si próprio, Adriano ajuda um dos seus companheiros de clandestinidade a fugir da prisão e morre aos tiros com a polícia, para defender os que estavam consigo. Estou inclinado a afirmar que esta morte nada tem que ver com a causa, com a ditadura do proletariado, mas sim com a vida, com a existência, que está perdida desde sempre. Não me parece que Adriano morra pelos outros.
Apelo da Noite, apesar de viver do comunismo e da clandestinidade, não se alimenta das ideias de Garaudy. Não. É um outro livro de mudança, de fuga para um novo trajecto, é um ex-marxismo.
[Paulo Ferreira]
Força
- Vergílio Ferreira, Apelo da Noite
[Paulo Ferreira]
domingo, setembro 09, 2007
Dez livros que não mudaram a minha vida*
A curiosidade abateu-se sobre mim quando, há poucos anos, conhecidos e amigos me falaram sobre Friedrich Nietzsche. Autor venenoso, língua em chama, caneta ardente. Comecei por ler o Anticristo e não gostei. Não apreciei, principalmente, o tom elevado com que Nietzsche aborda as Escrituras. A Origem da Tragédia foi outros dos livros que li e outro dos livros que não me agradou minimamente. Mais recentemente, peguei em Assim Falava Zaratustra. É inegável que estamos perante uma obra mais conseguida, mais pensada e mais bem elaborada do que as anteriores. Muitos dos temas de Nietzsche (vontade do poder, eterno retorno, homem superior, etc.) encontram-se na figura de Zaratustra. Todavia, não consegui, uma vez mais, ficar agradado com os escritos do autor. Talvez isso se deva à educação cristã que recebi em pequeno. Refira-se, apesar de tudo, que, se me dediquei à leitura do filósofo alemão, foi motivado pela curiosidade ou pelo referido interesse. Não tenho leituras do «porque sim». Há sempre uma motivação. Uma vontade de ingerir vitaminas para passar para etapas superiores. Foi o que fiz quando comecei a ler Schopenhauer, um autor de eleição.
Mas nem tudo o que se lê tem carácter pedagógico. Samuel Beckett dá-me puro prazer. Robert Walzer dá-me puro prazer. O mesmo se passa com Bioy Casares. Julgo, até, que é esse prazer da leitura que faz com que se pense na palavra de ordem deste desafio. «Livros que não mudaram a minha vida.» Um livro que não dê prazer é um livro que não muda uma vida, é um livro que não liberta. Guardo, porém, algumas reticências em relação a isso, já que, como referi anteriormente, uma leitura acarreta sempre uma mudança. Cada livro é um mundo, cada livro tem o seu universo interior. Ler um livro é entrar dentro desse universo. Não dá para dizer: não mudei nada com a leitura deste livro.
sábado, setembro 08, 2007
quinta-feira, setembro 06, 2007
Ágata
[Paulo Ferreira]