sábado, fevereiro 03, 2007

Babel



Brad Pitt gosta de chorar. Gosta de sofrer. Mas, verdade seja dita, sabe fazer isso bem. Lembra Mel Gibson e as suas obsessões pelo próprio sofrimento, pelas caras feias ao espelho. Em Babel, Cate Blanchett (mulher de Pitt no filme) é alvejada, e fica às portas da morte no interior desértico de Marrocos. E Pitt enlouquece com a sua quase plena impotência perante a situação, numa terra isolada que pouco tem a oferecer, pelo menos à primeira vista. Os culpados dessa situação são dois miúdos marroquinos, guardadores de gado, que disparam, sem pensar, a sua arma (para matar chacais) contra um autocarro a muitos metros de distância. A história deles e da sua família é outra das boas pérolas deste filme, pela sua simplicidade estranhamente cativante.

Ora, o contraste entre o drama de Bitt e Blanchett e a pacatez destruída da casa isolada das duas crianças marroquinas (e da sua família) seria mais do que suficiente para fazer este filme valer a pena. Mas Iñarritu não se contentou: acrescentou ainda a história dos filhos de Pitt, da sua empregada mexicana, do casamento do filho desta, do sobrinho, das autoridades americanas, de um caçador japonês, da filha muda do caçador japonês, dos polícias japoneses, das amigas e amigos da japonesa, das discotecas do Japão, enfim, uma multiplicidade de histórias que podiam ser cortadas. A crítica súbtil às autoridades americanas (na fronteira com o México), então, também era escusada.

Iñarritu pode ser irritante. Um bom realizador (pelo menos neste filme e em 21 Grams), mas com o dom de estragar ou exagerar um pouco o que tem. - tal como fez quando baralhou, e em demasia, as cenas do filme com Sean Penn. É um tique de realizador dito «alternativo» que, se acontecesse com um mainstreamer americano, seria condenável. Como o homem nasceu no México (com nome a condizer), passa como genial. Talvez seja do meu preconceito contra filmes que exacerbam as suas próprias pretensões. Ainda assim, merece nota e valeu a pena ir vê-lo.

[João Carlos Silva]

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