Certos colunistas dão-nos mesmo uma grande prazer de odiar. É claro que isso depende do lado em que nos encontramos, da trincheira que escolhemos. Mesmo não tendo escolhido trincheira para me aninhar fardado, com suma ideológica debaixo do braço, juntamente com alguns idealistas, tenho alguma ideia de onde me encontro politicamente. Sobretudo, sei onde me encontro por oposição aos outros.
Sendo assim, também tenho alguns colunistas de estimação. E também, especificamente, alguns «ódios de estimação». Ainda que eu próprio não seja ninguém, devo reconhecer a minha grande incapacidade para absorver a matéria que é, por exemplo, explanada nos artigos de Ana Sá Lopes. De tanta rejeição, não consigo evitar passar os olhos por tudo o que a colunista escreve. Outro exemplo é Miguel Sousa Tavares... pelo menos enquanto tinha a coragem de o ler.
Mas um caso peculiar é o de Rui Tavares. O historiador, que já esteve em distintos blogs para as bandas do Bloco de Esquerda, passou a escrever para o jornal Público há algum tempo, e veio dar uma nova cor às leituras de sábado. Começou bem, com temas menos comuns, menos batidos, e com um estilo diferente, não necessariamente «irreverente» (como tanto está na moda e como tanta gente gosta). Só é pena que Tavares, ultimamente, tenha desabado para uma certa repetição semanal das previsíveis posições que poderá tomar (e efectivamente toma) um militante ou ardente simpatizante do BE. Não falo da disposição libertária (que até é saudável) nem das preocupações sociais. Falo da atitude perante Estados Unidos, Reino Unido, Médio Oriente, Cavaco Silva e uns tantos que me ficaram na retina mas estão no esquecimento.
A sua particularidade, no entanto, vem da inteligência com que escreve. Vem, sobretudo da inteligência no humor com que escreve. Sem ser irritantemente irónico como o típico colunista contestatário nem profundamente assertivo ou pretensamente académico como um jovem colunista em ascensão, Rui Tavares consegue fazer-me obrigar a ler os seus artigos com toda a atenção todas as semanas. Até mesmo para desancar em Israel e desenrolar tudo aquilo que já se esperava que achasse sobre o conflito no Líbano, teve o cuidado de tentar elogiar «o povo de Israel» (embora eu ache que tal recurso seja uma pobre desculpa para debitar, em seguida, a tese geral das «potências agressoras»).
Pelo estranho vício de o ler, considero, por isso, Rui Tavares uma leitura obrigatória nos jornais da semana. Se há muita gente que marchou com a UDP nos bons velhos anos 70 mas hoje gosta sempre de visitar a coluna de Vasco Pulido Valente, eu pertenço a um outro género: os que, quando cansados da ladaínha extremamente desapaixonada do lado mais conservador, não hesita em ler Rui Tavares. Provavelmente, um futuro VPV. Na outra banda, é claro.
[João Carlos Silva]
sábado, agosto 12, 2006
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