quarta-feira, junho 07, 2006

Ilhas

Cair no chão estatelado é tudo o que um homem pode fazer quando nada mais existe.
Deixa-se de viver quando uma válvula do coração deixa de funcionar.
Morre-se quando o amor se acaba e quando se quer muito mas muito uma pessoa que já não nos conhece.
A loucura aparece no momento em que, depois de versos como «I used to pray to recover you» (Sylvia Plath), se põe a cabeça dentro de um forno de fogo e se explode o cérebro, como se este fosse um gafanhoto prazenteiramente esmagado por uma sola de sapato.
Tropeçar numa pedra e partir um pouco de osso é algo que não costuma matar: como as costureiras, também os médicos são profissionais na arte de coser. Mas o amor.
A vida separa-nos a todos, seres apaixonados, em dois e dois seremos até morrermos. Não somos como o chumbo que se derrete e se pode unir. Não somos como a bala que rompe o pêlo, a pele e a carne até se unificar com um órgão que, mais tarde, se tornará podre e escuro como a noite em que três pescadores de tubarões choraram em alto mar a perseguir os seus sonhos.
Somos ilhas aos tropeções.

[Paulo Ferreira]

1 comentário:

Patrícia disse...

A próxima vez que me atirarem à cara o meu pessimismo, remeto o dedo acusador para estas paragens... :)

Gostei do estilo.