terça-feira, maio 01, 2007

Portas e o «um para um»

Do Desesperada Esperança, do meu caro amigo Bruno Alves, parte outra farpa em direcção ao novo líder do CDS/PP. Que o Bruno não gosta de Paulo Portas já toda a gente sabe, mas que ele gosta tão pouco do homem e da sua «reentrada» (de facto, um falso regresso encenado) não tinha consciência.

Paulo Portas irrita, sobretudo, aquelas pessoas que têm a mania de que o universo da política é um universo de ideias. Um universo de engenheiros e juristas. O problema é precisamente esse: a política é a Política. Isso mesmo, com letra maiúscula. Só assim se compreende que, por exemplo, José Pacheco Pereira, detentor de uma presciência respeitável e mais ou menos certeira, não tenha lugar no mundo da política. Que homens de negócios de «sucesso», como António Borges, tenham tentado entrar no mundo da política de malas e bagagens ideológicas - no caso de Borges, uma sacrossanta cartilha liberal que não teve em conta o país em que vivemos - e falhado redondamente antes mesmo de começar. Só assim se entende que Paulo Portas, sem nunca ter uma ideologia fixa, um princípio orientador, continue a ter os argumentos para vencer. Erra, por isso, o Bruno ao avisar que «a retórica apaixonada [de Portas] apenas esconde a falta de cuidado e atenção aos aspectos mais àridos do debate político, logo por azar, os que realmente afectam a vida das pessoas». Portas não está na política para ajudar ninguém. Está lá para vencer batalhas de oratória. Para convencer sem argumentos. Para demolir a oposição e abrir caminho às ideias e soluções que outros trarão. Em linguagem futebolística, dir-se-ia que está «condenado» à missão do «um para um», sempre mais espectacular e visível, sem grande utilidade para a equipa mas capaz de virar o rumo de um jogo de futebol.

Os debates no Parlamento não servem apenas para comparar números. José Sócrates, apesar de parvo, não é estúpido. E a estratégia das «folhinhas A4 na mão», lançando para o ar números e cálculos (de relatórios e «estudos» oficiais do Governo) funciona muito bem. Não é por aí que cairá este governo. O governo cairá fazendo Sócrates tropeçar na sua própria retórica, no seu próprio moralismo. Trocando os pés por desatenção ou por incoerência, como já aconteceu (e está a acontecer) no caso da Universidade Independente. «Fight fire with fire», diz-se. E quem melhor do que Portas para isso? Ninguém lhe pedirá nunca contas, e é por isso que deve ficar eternamente na oposição. Sem dúvida, para seu desprazer. A vozinha irritante de Portas pode, de facto, derrubar governos. Ou, pelo menos, cansá-los. Com o cansaço, as incoerências surgem à tona.

A política é, por isso, uma arte, um universo da retórica, em que vencem aqueles que convencem, mas, sobretudo, vencem aqueles que perdem em grande estilo. Portas é um daqueles homens que, porque «vivem, de facto, da política», cairão sempre com um berro, como o Mel Gibson do Braveheart. Um grito vazio de conteúdo mas com uma forma muito inspiradora. No filme, resultava. No nosso mundo, é possível que seja muito útil à oposição. O Bruno esquece-se disso.



[João Carlos Silva]

1 comentário:

Anónimo disse...

Mas é isso mesmo. Excelente post.