Segundo uma reportagem num canal (respeitável) de outro país, uma família libanesa entrevistada - de aparência pobre - declarava, furiosa, que os membros do Hezbollah («terroristas», pelas suas palavras) são os culpados da crise e deviam ser apanhados. Disseram ainda que «só queriam condições para viver».
Nem uma menção, nem uma palavra contra Israel.
[João Carlos Silva]
domingo, julho 23, 2006
Segundo tratado sobre tascos
Passar por um tasco recôndito, na minha cidade, apenas para fazer a digestão não deve ser um acto menosprezado. Na verdade, é uma das acções mais gratificantes que um homem pode fazer. Eu diria mesmo que é uma das «cinco coisas a fazer antes de morrer», isso e votar em Mário Soares, entre outras tantas.
Ao passar a porta da baiuca para dentro, rapidamente ganhamos uma outra dimensão no nosso pequeno meio social. Como o exemplo do senhor José, que a dona Maria (dona da tasca) nunca antes viu, ganhar o apelido de «Baixinho» - apenas para ser tratado mais directamente pela matrona de serviço. Esqueçam o «se faz favor» e o «obrigado» (duas frases das quais admito não conseguir abdicar), não, na tasca os modos e a educação seguem outras linhas de orientação, outros graus: quer seja conhecer toda a gente, gostar do Vitória ou ser um dos últimos a abandonar o local do crime ao fim do dia.
Por outro lado, o elemento gastronómico é igualmente importante. Não só as moelas adquirem um valor comestível (que não consigo encontrar em qualquer outro lado), talvez pelo aroma que as frigideiras excessivamente usadas transmitem à comida, como também a bebida tem uma personalidade própria. Só nas tascas se bebem pequenos copos a vinte cêntimos, onde nem o vinho nem a gasosa que aí se misturam têm marca. Basta ver escrito nas garrafas Vinho e Gasosa para saber o que se bebe: nas tascas não se faz o vinho, o vinho acontece.
[João Carlos Silva]
Ao passar a porta da baiuca para dentro, rapidamente ganhamos uma outra dimensão no nosso pequeno meio social. Como o exemplo do senhor José, que a dona Maria (dona da tasca) nunca antes viu, ganhar o apelido de «Baixinho» - apenas para ser tratado mais directamente pela matrona de serviço. Esqueçam o «se faz favor» e o «obrigado» (duas frases das quais admito não conseguir abdicar), não, na tasca os modos e a educação seguem outras linhas de orientação, outros graus: quer seja conhecer toda a gente, gostar do Vitória ou ser um dos últimos a abandonar o local do crime ao fim do dia.
Por outro lado, o elemento gastronómico é igualmente importante. Não só as moelas adquirem um valor comestível (que não consigo encontrar em qualquer outro lado), talvez pelo aroma que as frigideiras excessivamente usadas transmitem à comida, como também a bebida tem uma personalidade própria. Só nas tascas se bebem pequenos copos a vinte cêntimos, onde nem o vinho nem a gasosa que aí se misturam têm marca. Basta ver escrito nas garrafas Vinho e Gasosa para saber o que se bebe: nas tascas não se faz o vinho, o vinho acontece.
[João Carlos Silva]
terça-feira, julho 18, 2006
Louçã: o cândido
Há dias, comentando o intensificar do conflito entre Israel e Líbano, Francisco Louçã declarou que aquele era apenas mais uma oportunidade para «George W. Bush» - o «dâbliu búsh» proferido em raiva traz outro sentido, tem sempre todo um mundo semântico por trás - fazer guerra ao Irão.
Eu sei que Louçã, entre outros milhares em Portugal, sonha com o dia em que o presidente americano tropeçará como Fidel tropeçou no palanque da outra vez. Mas sonhar com Bush dia e noite, sete dias por semana, todo o ano, ultrapassa mesmo a fé política mais carregada de alguma direita americana.
E esta obsessão de Louçã, atirada ao ar juntamente com a sua aversão primária a Israel (enquanto nação fundada naquela zona e enquanto aliada dos EUA), atropela a memória de todas as vezes em que a América condenou retaliações exageradas do exército israelita. Mais ainda, revela o oportunismo quase desumano de alguém que, distante do conflito, provavelmente achará mais grave Bush dizer «merda» do que o facto de soldados e civis israelitas serem sucessivamente raptados por grupos terroristas que se declaram (com o devido apoio) muçulmanos.
[João Carlos Silva]
Eu sei que Louçã, entre outros milhares em Portugal, sonha com o dia em que o presidente americano tropeçará como Fidel tropeçou no palanque da outra vez. Mas sonhar com Bush dia e noite, sete dias por semana, todo o ano, ultrapassa mesmo a fé política mais carregada de alguma direita americana.
E esta obsessão de Louçã, atirada ao ar juntamente com a sua aversão primária a Israel (enquanto nação fundada naquela zona e enquanto aliada dos EUA), atropela a memória de todas as vezes em que a América condenou retaliações exageradas do exército israelita. Mais ainda, revela o oportunismo quase desumano de alguém que, distante do conflito, provavelmente achará mais grave Bush dizer «merda» do que o facto de soldados e civis israelitas serem sucessivamente raptados por grupos terroristas que se declaram (com o devido apoio) muçulmanos.
[João Carlos Silva]
segunda-feira, julho 17, 2006
3
Três anos. Há três anos anda este rapaz a carregar uma desesperada esperança. Uma que, por muito desesperada que seja, continua e continuará cá por mais tempo. Parabéns.
[João Carlos Silva]
[João Carlos Silva]
sexta-feira, julho 14, 2006
As cadeiras
A minha atracção por cafés «semi-vazios» voltou, agora que o Mundial (infelizmente, por outro lado) acabou. Já voltou a ser possível chegar a qualquer hora do dia ao café da rua, do fim da rua, ou da esquina, e escolher uma mesa decente para me sentar - com as distâncias bem medidas, para que seja possível, com igual facilidade, gritar e arreliar o dono do café e atirar as beatas para a rua num jeitinho de dedos à taberneiro.
Com as vagas de calor e com uma antipatia muito pessoal em relação à praia, o snack-bar ou o café voltam a ser obrigatórios para alguns fins de tardes dedicados a livros, folhas e canetas. Especialmente porque, no dia em que o francês deu uma cabeçada ao italiano e em que Blatter nos deu uma cabeçada a todos nós, acabou (nos cafés) aquela dança das cadeiras que mais parecia a tomada de posse de um governo do PS.
[João Carlos Silva]
Com as vagas de calor e com uma antipatia muito pessoal em relação à praia, o snack-bar ou o café voltam a ser obrigatórios para alguns fins de tardes dedicados a livros, folhas e canetas. Especialmente porque, no dia em que o francês deu uma cabeçada ao italiano e em que Blatter nos deu uma cabeçada a todos nós, acabou (nos cafés) aquela dança das cadeiras que mais parecia a tomada de posse de um governo do PS.
[João Carlos Silva]
Viver na aldeia
Muitos de nós gostaremos ou saberemos dizer, prontamente, que uma das coisas que nos dá mais gosto fazer é ler um bom livro. No entanto, para quem ler bons livros se tornou já uma rotina aqui e ali viciante mas desapaixonada, um dos grandes prazeres continua a ser gritar depois de almoço, com um palito a aprumar o sorriso, à mulher: «Maria, guarda os ossos que é para dar de comer aos animais!». Isto, é claro, enquanto se aproveita para estampar as costas da mão na bochecha da criança.
[João Carlos Silva]
[João Carlos Silva]
quinta-feira, julho 13, 2006
O estado das coisas
Há aí um jovem promissor que escreveu uma frase muito profunda.
«Recordar é bem capaz de ser pior do que levar um tiro no peito.»
[Paulo Ferreira]
«Recordar é bem capaz de ser pior do que levar um tiro no peito.»
[Paulo Ferreira]
quarta-feira, julho 12, 2006
Leitores
Há dois tipos de leitores: aqueles que procuram identificar-se com o escritor; e aqueles que procuram identificar-se com uma personagem.
[João Carlos Silva]
[João Carlos Silva]
terça-feira, julho 11, 2006
O homem que ria para escrever
Fernando Assis Pacheco (1937-1995), um grande escritor? A pergunta poderá cair num grande vazio, onde ninguém a espera, onde ninguém lhe oferece resposta. De facto, mesmo se esse vazio estiver preenchido, é difícil trazer-lhe resposta. É difícil, mesmo, avaliar Assis Pacheco enquanto escritor, ou apenas como tal. Assis Pacheco ramificou (talvez de forma nefasta para vingar no campo do romance) a sua obra, os seus caminhos, de escritor em diversas áreas: romance, poesia, crítica, crónicas, até entrevistas. É, realmente, difícil encontrar um campo em que ele não tenha dado uma perninha. Mas, curiosamente, em todos eles Fernando Assis Pacheco traz a mesma «pena».
A escrita de Pacheco tem, sim, sempre o mesmo motor por trás: um grande sentido de humor. Não serão, portanto, alheias ao leitor expressões aproximadas a «passando-lhe o tempero de alto a abaixo, enfiou-lhe um espeto de pau pelas nalgas e pô-lo a assar». Ou mesmo, num outro registo, «enchi a pata» ou «olé que lá vai ela». A Assirio & Alvim tem, feito, inclusivamente, um pequeno esforço para trazer a lume alguns inéditos de um autor já de si fragmentado nas editoras ou, pelo menos, de escassa edição (normalmente, tem as suas obras na ASA), e o Memórias de um Craque é um «pequeno» livro imperdível dentro do espaço desse esforço da Assírio.
Será um grande escritor? Tendo em conta o seu género de humor, muito a puxar para o vernáculo (e eu, admito, derreto-me com uma escrita que saiba utilizá-lo bem), poderá ser tido como um «granda escritor» por muita gente menos exigente, que esquece o que está sob essa primeira camada literária. Debaixo dela está um homem de grande sensibilidade, cultíssimo, com uma modéstia digna de um génio capaz de deixar obra importante até em crónicas da bola, mas também com um talento considerável capaz de pôr burgessos na lista de personagens a reter na literatura portuguesa. Pode não ter sido um «grande escritor», mas foi sem dúvida um grande homem com talento para a escrita.
[João Carlos Silva]
domingo, julho 09, 2006
Namora: entre a simpatia e o tédio
Leio vários livros de Fernando Namora e fico com uma vontade enorme de doar todo o meu sangue a quem dele precisa. Mas também eu preciso do meu sangue. Sou muito egoísta. Namora escreve elegias à União Soviética, sonha com o Estado Social dos países nórdicos, fala com uma bondade extrema. E eu sensibilizo-me. Mas sou egoísta. Não posso gostar de regimes que lutavam pela igualdade (inexistente enquanto conceito aplicável ao mundo dos vivos, esta palavra). Não posso gostar de regimes que partiam do operariado para os senhores do partido. Não posso. E, por isso, não posso concordar com nada do que aparece nos livros do homem que morreu a praticar o bem. Contudo, tem de se perceber o contexto da época do homem que escreveu coisas como Os Adoradores do Sol. Esse contexto era o neo-realismo, era um contexto, mais que literário, cultural, no qual se escrevia com uma mão pouco desprendida, no qual o amor aos heróis que lutaram pelo povo se impunha à barbárie corrupta dos tempos modernos. A América nunca poderia ser adorada por intelectuais apegados ao campesinato. É muito mais fácil nutrir carinho por sociedades onde a população vive toda pobre mas igual, do que por sociedades repletas de desigualdades e de oportunidade de ascensão e de queda por parte daqueles que procuram viver de dinheiro (perceba-se que o dinheiro, neste momento, é tudo, inclusive a literatura).
Fernando Namora não é um homem de difícil compreensão. Apesar de escrever bem, muito bem, este intelectual, que também foi médico e filantropo, não entusiasma. Os livros de Namora são de entediar as moscas mais atarantadas. Exceptuando O Rio Triste ou Cidade Solitária, pouco de interessante há a retirar da obra de Namora. Temos os livros de viagens propagandísticos que, vá-se lá saber porquê, Namora apelidou de cadernos de um escritor, que são das coisas mais aborrecidas que tive oportunidade de ler. Temos narrativas literário-sociológicas ( Estamos no Vento, por exemplo), temos, enfim, escritos que não satisfazem o olhar, ao mesmo tempo aguçado e desprevenido, do leitor que queira conhecer a literatura portuguesa da segunda metade do século XX. Refira-se, no entanto, que a literatura portuguesa, seja de que século for, não costuma ser conhecida pela sua qualidade elevada. Há até quem fale de «Portugalzinho» quando aparece um novo escritor ou colunista de mangas arregaçadas e pronto a escandalizar as mentes provinciais da paróquia nacional com os seus comentários acutilantes, com os seus rasgos de estilo geniais, do género «amei, sofri». No fundo, Namora não tem nada de novo. É pouco original. Traz pouco ao mundo da literatura. Não obstante tudo isso, eu simpatizo com ele.
[Paulo Ferreira]
Fernando Namora não é um homem de difícil compreensão. Apesar de escrever bem, muito bem, este intelectual, que também foi médico e filantropo, não entusiasma. Os livros de Namora são de entediar as moscas mais atarantadas. Exceptuando O Rio Triste ou Cidade Solitária, pouco de interessante há a retirar da obra de Namora. Temos os livros de viagens propagandísticos que, vá-se lá saber porquê, Namora apelidou de cadernos de um escritor, que são das coisas mais aborrecidas que tive oportunidade de ler. Temos narrativas literário-sociológicas ( Estamos no Vento, por exemplo), temos, enfim, escritos que não satisfazem o olhar, ao mesmo tempo aguçado e desprevenido, do leitor que queira conhecer a literatura portuguesa da segunda metade do século XX. Refira-se, no entanto, que a literatura portuguesa, seja de que século for, não costuma ser conhecida pela sua qualidade elevada. Há até quem fale de «Portugalzinho» quando aparece um novo escritor ou colunista de mangas arregaçadas e pronto a escandalizar as mentes provinciais da paróquia nacional com os seus comentários acutilantes, com os seus rasgos de estilo geniais, do género «amei, sofri». No fundo, Namora não tem nada de novo. É pouco original. Traz pouco ao mundo da literatura. Não obstante tudo isso, eu simpatizo com ele.
[Paulo Ferreira]
quinta-feira, julho 06, 2006
Herói
Com as suas fintas lentas, com o seu cabelo caprichado, com o seu estilo guerreiro, Luís Figo, o melhor jogador nacional (quase) de sempre, merecia estar presente numa final de um Campeonato do Mundo. Ontem sofri por ele.
[Paulo Ferreira]
[Paulo Ferreira]
terça-feira, julho 04, 2006
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