quinta-feira, setembro 18, 2008

Os Sete Samurais



Assisti, há um par de dias, a um dos melhores filmes que já me passaram pelos olhos. Alternando confortavelmente entre as posições de sentado e deitado, com as pernas estendidas, tive umas das três horas mais intensas da minha história do cinema. Cerca de 200 minutos, para ser mais preciso. Vi Shichinin no Samurai, ou seja, Os Sete Samurais, um filme de Akira Kurosawa de 1954, uma das décadas douradas da criatividade cinematográfica. É um filme espantoso.

Os sete samurais são, de facto, sete samurais distintos, com diferentes personalidades entre si e características muito próprias. Kambei é um samurai e mestre velho e experiente que é recrutado por uma aldeia de, aparentemente, parcos recursos para combater na sua defesa contra um grupo de ladrões que tem vindo ocasionalmente a pilhar os recursos dos aldeões. Sem mais nada para oferecer do que comida, o ancião da aldeia propõe que se procurem «samurais famintos», já que apenas estes se sentiriam tentados pela oferta, de facto, muito pouco sedutora. Kambei é o primeiro a ser recrutado e é ele que vai preparar, aos poucos, o grupo que vai defender a aldeia.

Aos poucos vai encontrando velhos amigos e gente de confiança (Gorobei e Shichiroji), um discípulo (o nobre e fiel, mas inseguro, Katsushiro), dois samurais que por acaso aparecem na cidade (Heihachi e Kyuzo) e, por falta de homens, um problemático espadachim chamado Kikuchiyo, que se torna a verdadeira «estrela da companhia». Kikuchiyo aparece visivelmente bêbado na casa onde os restantes seis homens se reuniam, dizendo que quer ser um samurai, pelo que troçam dele e acabam descobrindo que ele nem sequer é quem diz ser, tendo roubado um pergaminho de uma família de samurais que - segundo ele - confirmava a sua linhagem nobre. Sem que ninguém o leve a sério, Kikuchiyo vai seguir o grupo pelos bosques enquanto estes se dirigem para a cidade que vão defender. É assim que nasce o número sete, e os Sete Samurais.

O filme de Kurosawa é um épico do outro mundo. O próprio tempo de duração é a primeira prova disso. Mas a primeira grande marca a ser deixada pelo filme é a criação de um grupo de personagens. Um grupo coeso, dentro do qual as relações são mais intensas, mesmo nas pequenas coisas. É a camaradagem dos sete samurais que nos deixa imediatamente rendidos ao filme. Vários westerns e filmes de guerra mais tarde trouxeram o mesmo tipo de união para o cinema, se bem que com bastante mais malícia nas suas personagens (conferir Dirty Dozen do Aldrich), mas foi este filme de Kurosawa que deixou a semente.

O perscurso emocional e moral de cada personagem, incluindo os aldeões, é, no entanto, a verdadeira pérola deste filme que tem mais de cinquenta anos. A maneira como nos apegamos sentimentalmente ao grupo é evidente no momento em que o primeiro dos sete morre, e não vou dizer quem (dizê-lo seria ruinoso para o argumento e para quem ainda não viu), ficando um certo vazio e um sentimento de vingança iminente no estômago. A transformação de Kikuchiyo - uma figura caricata, um homem bonacheirão, aparentemente exibicionista e presunçoso mas que revela ser, até ao fim, um guerreiro humilde, com bom coração e com lealdade a todos os que o rodeiam - promete ser a melhor de todas, e o próprio Kikuchiyo não sairá do imaginário de quem já viu este filme. É, sem dúvida, uma das melhores personagens de sempre do cinema.

Para mim, que sou um leigo em cinema japonês e, consequentemente, em Kurosawa, este filme foi uma descoberta espantosa. Cinco estrelas. Um dos melhores filmes de sempre.

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